TDAH transforma a sala de aula num desafio: carteiras alinhadas, o quadro branco cheio de anotações, crianças levantando a mão – e aí, no canto, meu filho de 8 anos, balançando as pernas como se fossem hélices, o lápis rolando pra debaixo da mesa pela terceira vez. A professora, com um sorriso paciente, pede pra ele pegar o caderno, mas ele já está desenhando um robô voador no canto da folha, alheio ao pedido.
Meu filho tem TDAH, e eu sei que, por trás daquele caos adorável, há um cérebro que luta pra organizar o mundo – a hiperatividade e a falta de atenção brincando de esconde-esconde com ele. Isso é sobre as funções executivas – as habilidades que ajudam a planejar, focar e resistir aos impulsos. Na escola, elas são testadas a cada minuto. Como mãe, já vivi as reuniões com professores, as ligações pra casa e o alívio de encontrar jeitos que funcionam. Vamos desvendar isso juntos e descobrir estratégias práticas pra fazer a sala de aula um lugar onde ele – e outras crianças com TDAH – possam brilhar?

O que são funções executivas e por que elas importam no TDAH? Funções executivas são como o “maestro” do cérebro – elas regem a memória de trabalho, o controle inibitório e a flexibilidade cognitiva. Pense na memória de trabalho como um post-it mental: é onde guardamos instruções (“pegue o caderno, abra na página 10”). O controle inibitório é o freio: impede que ele saia correndo atrás de uma ideia aleatória no meio da aula. E a flexibilidade é o plano B: ajustar quando o dever muda de repente.
Estudos do Dr. Russell Barkley, um dos maiores nomes em TDAH, mostram que crianças com o transtorno têm um atraso de até 30% no desenvolvimento dessas funções (Barkley, 2012). Meu filho, por exemplo, conseguia montar um castelo de Lego em casa, mas na escola, onde tudo vem com prazos e regras, era como se o maestro tivesse saído pra tomar café. Na sala de aula, isso vira esquecimento, interrupções e, às vezes, frustração – dele e de quem está ao redor.
O desafio na escola: um dia na vida dele Já parou pra pensar como é o dia de uma criança com TDAH? Às 8h, ele entra na sala, o barulho das cadeiras arranhando o chão o deixa zonzo, e a professora suspirava, tentando esconder a frustração. Ela explica a atividade – “escrevam três frases sobre o fim de semana” –, mas enquanto os outros começam, ele ainda está procurando o lápis que caiu, a atenção escapando como fumaça. Quando finalmente escreve, a campainha toca, e a próxima aula exige trocar o caderno rapidinho. Ele tenta, mas o caderno de matemática ficou na mochila, e o de português está cheio de rabiscos de robôs. Eu já vi os olhos dele brilharem contando uma ideia genial, mas na escola, essas funções executivas travadas transformam o brilho em um “não consegui”. Já sentiu esse aperto no peito vendo um pequeno se perder assim?
Estratégias práticas: o que funciona na sala de aula Depois de muitas conversas com professores e tentativas em casa, descobri que pequenas mudanças fazem diferença gigante. Aqui vão estratégias que vão além do básico, testadas no dia a dia e apoiadas por quem entende do riscado:
- • Quebre as tarefas em pedaços coloridos: Crianças com TDAH se afogam em instruções longas – meu filho era prova disso. Uma professora dele começou a usar cartões coloridos – vermelho pra “pegue o caderno”, amarelo pra “escreva a data”, verde pra “faça a tarefa”. Ele seguia um por vez, como um jogo, e o orgulho de completar cada passo era visível no sorriso. Um estudo da Journal of Child Psychology and Psychiatry (2020) mostra que dividir tarefas reduz a sobrecarga na memória de trabalho – e eu vi isso na prática.

- • Sinalize o tempo com algo que ele veja: Meu filho nunca “sentia” o tempo passar – a hiperatividade o mantinha num looping. Um dia, a professora trouxe um timer de areia – desses de três minutos, com grãos caindo devagar. “Quando acabar, você troca de atividade”, ela disse. Ele ficou hipnotizado olhando a areia, e pela primeira vez terminou algo sem eu ouvir “ele não parou quieto”. O visual ajuda mais que um “rápido!” gritado no vazio.
- • Dê um cantinho pra “descarregar”: Na escola dele, criaram um “espaço seguro” – um tapete com almofadas num canto da sala. Se ele ficava agitado demais, podia ir lá, pular cinco vezes ou apertar uma bola antiestresse, depois voltar. Não é castigo, é reset. Uma pesquisa da American Academy of Pediatrics (2018) sugere que pausas motoras curtas melhoram o controle inibitório – e eu juro que vi ele voltar mais calmo.
- • Use lembretes visuais no lugar de broncas: Professores adoram dizer “preste atenção”, mas pro meu filho, isso era vento. Um dia, a professora colou um desenho de um olho na carteira dele – um código secreto pra “foca aqui”. Ele ria toda vez que via, mas funcionava. Barkley chama isso de “apoio externo” pras funções executivas (2012), e eu chamo de genialidade simples.

- • Flexibilize o “como”, não o “o quê”: Ele odiava escrever redações, but adorava inventar histórias. Uma professora deixou ele gravar um áudio contando o texto antes de escrever – o resultado foi um conto sobre um dragão que salvava a escola, e depois ele transcreveu feliz. Dar opções mantém o objetivo sem travar a criatividade.

O papel do professor com crianças com TDAH: parceria é tudo E enquanto eu tentava em casa, percebi que o segredo estava na sala de aula – parceria é tudo. Já chorei depois de reuniões onde ouvi “ele precisa se esforçar mais”. Mas os professores que fizeram diferença foram os que viraram parceiros. Uma vez, uma delas me chamou pra conversar e disse: “Ele é brilhante, só precisa de um caminho diferente”. Ela ajustou a sala – menos barulho, instruções curtas – e me mantinha no loop com bilhetinhos: “Hoje ele terminou a tarefa!”. Estudos da Educational Psychology Review (2019) mostram que a colaboração entre escola e família dobra as chances de sucesso acadêmico em crianças com TDAH. Então, se você é professor ou pai, sentem juntos – vale cada minuto.
E quando não funciona? Nem tudo é mágica. Teve dias que o timer caiu no chão, o cantinho virou bagunça e ele voltou pra casa com a mochila cheia de tarefas incompletas. No dia seguinte, testamos um cronômetro no bolso dela – e funcionou melhor. Nesses momentos, aprendi a respirar fundo e lembrar: o TDAH não é linear. Um psicólogo me disse uma vez: “É como ensinar ele a dançar com o próprio cérebro”. Às vezes, o passo sai errado, mas a gente ajusta o ritmo e tenta de novo. Já viu um dia assim virar aprendizado?
O que fica disso tudo? No fim, as funções executivas são o calcanhar de Aquiles do TDAH, mas não precisam ser o vilão da história. Na escola, meu filho não é só o “menino agitado” – ele é o que inventa robôs voadores, o que surpreende com ideias que ninguém espera. Com estratégias práticas, paciência e parceria, a sala de aula vira palco pro que ele tem de melhor. E eu, como mãe, aprendi que apoiar não é consertar, mas abrir caminhos pra ele dançar do jeito dele – mesmo que seja com um lápis rolando no chão.
Referências
- Barkley, R. A. (2012). Executive Functions: What They Are, How They Work, and Why They Evolved. Guilford Press.
- Journal of Child Psychology and Psychiatry (2020). “Task Segmentation and ADHD: Reducing Cognitive Load in Children.”
- American Academy of Pediatrics (2018). “The Role of Physical Activity in ADHD Management.”
- Educational Psychology Review (2019). “Family-School Collaboration and ADHD Outcomes.”
E o melhor ainda está por vir: Quer entender como um olhar especializado pode transformar o apoio a crianças com TDAH? Não perca o próximo artigo:
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